A detenção de cerca de uma dezena de jovens manifestantes pela Polícia Nacional Angolana está sendo considerada ilegal pelo advogado de defesa, basicamente por ter excedido o período, segundo o Código Penal, do começo de processos sumários.
Desde a detenção dos jovens aos 22 de Dezembro, passaram-se 6 dias sem nenhuma aparição em tribunal, e hoje, o julgamento terá lugar mas provavelmente não chegará ao fim e sendo assim, alastrando-se para o ano 2013.
Os jovens integrantes do Movimento Revolucionário foram detidos durante um protesto que visava exigir a liberdade de Isaías Cassule e Álves Kamulingue desaparecidos aos 27 e 29 de Maio deste ano.
O julgamento dos jovens que devia ter começado ontem, 27 de Dezembro, foi adiada para hoje alegadamente devido a ausência do juíz.
O processo terá lugar no tribunal Dona Ana Joaquina, frente ao Ministério das Relações Exteriores (MIREX) e a Robert Hudson, na Maianga.
O advogado de defesa, Luís do Nascimento, questionou a legalidade da detenção segundo os artigos 381º e 391° do Código Penal que dita o começo da realização de processos sumários num período máximo a 48 horas após a detenção dos réus.
O Movimento Revolucionário alertou sobre várias incongruências registadas no processo sumário.
“A informação acerca de onde e quando seriam julgados está a ser propositadamente ocultada para facilitar mais uma fantochada de julgamento sem defesa, ou com ‘defesa’ do promotor público, quando nós já temos advogados que se prontificaram para nos representar: Luís Nascimento e Marcolino Moco,” disse Luaty Beirão, um dos integrantes do Movimento.
Os jovens manifestantes, que encontram-se detidos na Direcção Provincial de Investigação Criminal (DPIC), manifestaram descontentamento pelo mau tratamento a que estão a serem submetidos.
Eles alegam serem submetidos à fome e que um dos jovens detidos, António João Ferreira Broas, esteve com paludismo e passou a noite com febres altas e que não lhe foi prestada nenhuma assistência médica.
A reclamação foi denunciada pelo jovem Jang Nomada, que conseguiu chegar a tempo de interpelar o carro-cela onde seguiam os jovens detidos para ouvir deles.
“Não nos estão a dar de comer,” disseram os detidos ao Nomada.
“Os manos estão a passar fome, e não é uma greve voluntária, e estão ilegalmente detidos. O julgamento sumário deve ocorrer no primeiro dia útil após a sua detenção,” disse.
Tendo-se apercebido do sucedido, os jovens Américo Vaz e Jang Nomada foram a DPIC, onde foram informados que não podiam visitar os detidos, mas em contrapartida, fizeram questão de deixar alguns alimentos para os detidos.
Durante a manifestação de Sábado, 22 de Dezembro, onde os jovens foram detidos, a Polícia de Intervenção Rápida (PIR), fazendo o uso de força excessiva e agredindo manifestantes com porretes, gás lacrimogéneo e balas de borracha, prendeu dezenas de jovens activistas e peões que foram levados para a 4ª, 5ª e 6ª esquadras.
A marcha partiu do Largo da Independência, no 1º de Maio, e foi reprimida pela polícia na rua Marian Ngoubi em direção ao Ministério da Justiça, na Maianga.
Pelo impedimento do percurso da marcha pela polícia nacional, o Movimento juvenil defendeu que elementos infiltrados na manifestação pacífica, causaram distúrbios em gesto de retalhação às agressões policiais.
No mesmo dia, a polícia deteve e libertou Zita Conde, Marcelina Carlos, Lacerda Van-dúnem e mais quatro jovens anónimos que estavam na 6ª Esquadra junto à Assembleia Nacional.
De forma selectiva, a polícia manteve detidos os jovens: Hugo Kalumbo, Gabriel Chakussanga, Mateus Chiwale, Salomão “Alemão” Franciso, Baltazar Alberto e António João Ferreira Broas.
Numa reportagem, a que os jovens denominaram de “distorcida” por terem sido referenciados como “afiliados à UNITA”, pela Televisão Pública de Angola (TPA) no dia da manifestação, a Polícia Nacional prometeu remeter o processo as instâncias judiciais, levando os jovens a tribunal por supostamente causarem “pânico, distúrbios público, vandalismo à propriedades privadas e insultos à polícia”.
Tal como nas detenções que sucederam durante as manifestações passadas, a convite da polícia, a TPA entrevistou jovens detidos, num acto que os manifestantes descrevem como uma tentativa de forçar os jovens a admitirem supostas culpas publicamente.
Na reportagem, o jornalista da TPA diz que “um dos líderes da manifestação assume em nome do grupo os danos e reconhece que essa não foi a via mais correcta de reivindicar”.
Contrariamente, em nenhum momento o jovem entrevistado, Salomão Francisco, admite culpa embora ter lamentado pelo que aconteceu com as viaturas.
Pela TPA, o Segundo Comandante Provincial da Polícia de Luanda, Dias do Nascimento, confirmou a detenção de 6 jovens e registou “12 viatura totalmente danificadas”.
Dois dias antes da manifestação, 6 jovens membros do Movimento juvenil e dois familiares dos desaparecidos, Isaías Cassule e Álves Kamulingue, tiveram um encontro com o Ministro do Interior, Ângelo Tavares, onde as autoridades comprometeram-se a abrir um processo de inquérito sobre os desaparecimentos.
A reunião contou com a presença do adjunto do Procurador Geral da República, Arcanjo Custódio, o Comandante Geral da Polícia Nacional, Ambrósio de Lemos, o Director Nacional de Investigação Criminal (DNIC), Eugénio Pedro Alexandre, e o Secretário do Estado para a Juventude, Nhanga Assunção.
No encontro, o Ministro do Interior disse “não ter a mínima intenção de coartar os (…) direitos (dos jovens)” mas avisou que tinha “inteligência que haverá infiltrados na manifestação para denegrir a nobre causa e tirar daí dividendos políticos”.
Ângelo Tavares ameaçou que “se houver comportamentos irregulares e à revelia da lei, a polícia terá de intervir para repor a ordem e a tranquilidade”.
Dito e sucedido, a manifestação que foi brutalmente reprimida pela polícia de intervenção Rápida, num acto que o Movimento disse que estava “convicto que os dois jovens que decidiram pegar em pedras para confrontar a polícia anti-motim, fazem parte dos tais que o Ministro Ângelo Tavares mencionou como ‘infiltrados para tirar dividendos políticos’.
“A questão agora é quem beneficia mais com a generalização da imagem de manifestantes ‘confusionistas’? Serão os partidos da oposição que poderão acusar o regime de repressivo incorrigível, ou o regime que pode continuar a mostrar que os jovens não conseguem que se lhes dê a mão, querem logo o braço? Uma coisa é certa, os únicos que não beneficiam NADA são os manifestantes, por isso não haveríamos de infiltrar ninguém com intuito de subverter aquilo que professamos,” disse o Movimento juvenil.
Diante de mais um julgamento sumário, o Movimento Revolucionário juvenil publicou várias fotografias e vídeos que expoem a brutalidade policial sofrida pelos seus integrantes.
Os jovens pretendem usar tais materiais visuais como evidências incontestáveis no julgamento “sumário” dos seus integrantes.
Por: Pedrowski Teca | Quinta-feira, 28 Dezembro 2012